Equação dos Afectos

Equação dos Afectos

A notícia do diagnóstico da doença de Parkinson é uma realidade difícil. Aceitar e aprender a viver com ela é uma tarefa árdua, mas que, com o devido apoio, se consegue.

A equação da vida do doente passa a ter como denominador a doença, o que significa que tudo é alterado e condicionado pela doença. Não só a equação do doente é alterada, bem como a das pessoas que estão envolvidas. O empenho do doente e do meio envolvente é imprescindível. Delinear estratégias funcionais e aplicá-las de forma eficaz exige um trabalho longo, que deve ser vivenciado de forma gradual em função da aceitação e do ritmo de cada um. Porém existem ingredientes que não podem faltar. 

O primeiro ingrediente que deve temperar a mente do doente e da família/cuidadores é facilitar as relações. A flexibilidade e tolerância, perante as frustrações e dificuldades de cada um, facilitam o quotidiano e permitem crescer com o outro. Ao crescermos com o outro estamos a alimentar uma emoção de grande riqueza afetiva – a cumplicidade. O doente isola-se para não sobrecarregar nem limitar a vida de quem o rodeia. 

O segundo ingrediente é promover a proximidade, o afeto, a atenção e o sentir-se válido é uma vitamina para a auto-estima do doente. O que muitas vezes corrói a auto-confiança do doente é o confronto com as limitações físicas e o medo de ver o seu papel como indivíduo familiar, social e laboral hipotecado. 

O terceiro para promover saúde física e mental é a compreensão.Compreender que a doença traz uma redução da rapidez dos reflexos e que refletir-se-á no tempo. A compreensão tornará o dia-a-dia mais suave. 

O quarto ingrediente é colaboração na superação de obstáculos. O doente tem que se responsabilizar pelo seu processo e não pode ficar a espera que sejam os outros a lutarem por ele, mas também precisa de colaboração do meio, dos pares, da família, para reforçar de forma positiva todo o seu empenho. 

O quinto ingrediente é transmitir domínio nas situações difíceis. Se o doente sente que a família perde o domínio e que a doença está a sufocar, um sentimento de desespero e de tristeza invadem a sua mente. A única forma de evitar que isso aconteça é alimentar a comunicação nos casais e nas famílias, é o caminho para a construção e edificação de soluções (nem sempre existem soluções, mas quase sempre podemos minorar os problemas). O silêncio traz uma fonte de riqueza acerca de cada um de nós, deve ser lido com atenção e nunca desprezado. 

O sexto ingrediente é a generosidade, sobretudo em momentos delicados, quando oferecida com transparência é um bálsamo. 

O sétimo ingrediente é a gratidão. As famílias/cuidadores, que agarram a luta da qualidade de vida do doente, precisam e devem sentir gratidão por parte do doente, uma relação sem reciprocidade não ganha forma nem equilíbrio. A gratidão é o que move e alimenta a relação.

Todos estes ingredientes exigem um processo de maturidade do doente e de quem o rodeia, este processo de maturidade não é específico da doença. A persistência é um dos alicerces do sucesso. O doente de Parkinson tem que acreditar no seu sucesso, sem desistir de nenhuma das áreas da sua vida (familiar, social e laboral). Desistir é uma palavra que o aterroriza constantemente, não porque quer, mas porque, por vezes, a luta é tão difícil, que é tentador ponderar desistir. Quando sentimos que este momento se aproxima, precisamos de o ajudar a se focar em tudo o que já conquistou, nunca dando a entender que é fácil nem simples. Assumir que não ter a doença, não permite imaginar o que o doente sente. Este é um ponto de honra entre o doente e quem o rodeia. 

Veronica Ferreira* (2013). Equação dos afectos. Revista Parkinson, n.º31, 2013.

*Psicóloga Clínica